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2010-12-29

Never lost control

Uma vez, há sei lá quanto tempo, eu estava assistindo Quem quer ser um milionário? com o meu (ex-)namorado, que ficou sinceramente surpreso - e exasperado - por eu ter mantido toda a calma do mundo enquanto o dvd enganchava por quase meia-hora de filme. 

.x.

Uma vez, há uns dois anos, um amigo meu derrubou sem querer o meu celular no chão. O celular, obviamente, se arrebentou todo e nem ligava mais. Ele ficou se desculpando, todo preocupado, e eu na maior calma do mundo, dizendo que tudo bem, ia dar pra consertar.

(e deu mesmo.)

.x.

Uma vez, há apenas algumas semanas, uma professora louca disse que ia reprovar a mim e a um amigo meu porque dissemos, entre outras coisas, que ela não ensinava bem. Depois ela começou a fingir que não me ouvia e fechou a porta na minha cara. Não fiquei na maior calma do mundo, mas talvez seja digno de nota que eu não voei em cima da mulher nem quando ela veio tirar com a nossa cara alguns dias depois.

(e não, não fomos reprovados)

.x.

Uma vez, há alguns meses, uma amiga me disse que tinha medo de mim porque eu era muito calma.

.x.

Eu estava pensando nisso hoje e cheguei a conclusão de que às vezes eu posso ser assustadoramente otimista. Porque não é só uma questão de paciência, sabe? É mais algo como pôr na cabeça de que as coisas têm jeito e vão ser devidamente resolvidas. Fico pensando quantas vezes isso não foi tomado como apatia, mas nem é. 

Quanto tenho crises de raiva ou impaciência, geralmente tenho em casa -- geralmente, não sempre. E por coisas maiores/piores dos que as acima citadas. E mesmo assim, depois de tudo, depois de passar horas pensando que a vida é mesmo uma merda sem solução, eu paro e penso que no fim tudo fica bem. 

Vou adicionar isso na lista de Motivos pelos quais eu sou insuportável.

2010-12-22

Daí que hoje me peguei pensando em Deus

Pra mim é fácil responder à pergunta "você acredita em religião?" Eu prontamente vou dizer a religião é necessária ao mundo, mas que na maior parte das vezes falha miseravelmente naquilo que se propõe a fazer, e que a culpa disso geralmente é dos próprios fiéis. Mas em geral eu fujo da pergunta "você acredita em Deus?". Essa é mais complicada.

Durante muito tempo eu evitei responder essa pergunta, porque pra mim as coisas precisam seguir uma certa lógica, e Deus obviamente não fazia parte dessa lógica. Na verdade, até fazia, quando colocado sob a luz de ser uma invenção do homem. Isso fazia sentido pra mim, fazia sentido que não existisse, fazia sentido que eu não acreditasse, mas o fato é que eu nunca questionei de verdade. Eu nunca acreditei realmente que não acreditasse. E hoje eu cheguei a uma conclusão.

Eu nasci em uma família católica que nunca foi particularmente religiosa - dessa de seguir direitinho todos os rituais e etc. Na verdade, fazemos parte daquela parcela enorme que tem a religião mais como algo enraizado no consciente através de séculos de tradição adaptada do que como a tradição em si. Depois da minha primeira comunhão, só fui a missas de sétimo dia, de formatura e de casamento. Na verdade, a coisa que eu mais gostava na igreja era olhar para as estátuas de anjos, e na maior parte do tempo morria de tédio. Não encontrei Deus em missas, em sermões de padres, e nem mesmo na Bíblia. Porque, bom, já que Ele existe, certamente é bem maior do que tudo isso.

E, como eu disse no começo, não acredito em religiões. Não acredito nesse emaranhado de regras que dizem o que você deve fazer pra não ir pro inferno. Deus foi transformado em uma entidade cruel e intransigente por séculos e séculos de más interpretações que o distanciaram cada vez mais da imagem de pai amoroso e generoso, e o aproximaram dos primeiros tempos, em que ainda era glorificado em altares com sacrifícios de sangue.

Mas então.

Desde de muito criança eu era louca por revistas e livros científicos. Eu lia as teorias sobre as divisões do átomo e sobre novas estrelas desde muito antes de poder entender do que aquilo estava falando, e ficava fascinada (e, veja só a ironia da vida, sempre odiei Física na escola). Eu queria saber como as coisas funcionavam e, pensando bem, o mais fascinante nisso era que tudo tinha uma resposta. As explosões das estrelas, as leis da física, a proporção perfeita do crescimento das árvores, até a criação do Universo, tudo isso tinha uma resposta, tinha uma explicação, ainda que incompleta. Como se estivéssemos sempre levantando um véu de uma coisa muito maior pra ver um pedacinho a mais. E sempre me fascinaram também as questões sem resposta; se existe vida após a morte, porque estamos aqui, o que acontece depois, o que está acontecendo agora. O que faz sentido e o que não faz sentido sempre se misturando.

Não tenho nada contra o ateísmo, e nunca que pretendo sair por aí ~convertendo~ pessoas, credo. Apenas percebi que, pra mim, Deus existe. Existe porque o universo existe. O homem não criou as estrelas, não criou a matemática, não criou a gravidade. O homem criou o computador, os robôs, os ônibus espaciais. Enfim, criou os modos de lidar com o que já existia. Descobriu uma maneira de ver o que já estava aqui desde o início dos tempos. Ninguém sabe o que aconteceu antes do Big Bang. Ninguém sabe se nós somos as únicas criaturas inteligentes do universo. Ninguém sabe sequer se esse é o único universo existente. A existência da humanidade pode ser descrita como um erro de cálculo infinitesimal; e, no entanto, existimos. Temos corpos que funcionam num sistema perfeito e, puta que pariu, temos um cérebro que até hoje não sabemos exatamente como funciona por completo e nem do que é capaz de fazer. Isso pra mim já é milagre o suficiente.

Não acredito que todos as desgraças do mundo aconteçam porque "Deus nos abandonou" ou porque "estamos sendo castigados pela falta de fé". Até porque o que eu chamo de Deus é, basicamente, uma força maior. Simples assim. Acredito que exista uma força maior, e essa força maior não tem obrigação de interferir em cada topada que as pessoas dão. É muito fácil dizer que a culpa é de algo maior do que nós, não é? Difícil é ver que sempre estivemos por nós mesmos. De certo modo, tudo vira nada mais nada menos do que uma transferência de culpa. Nada digno, hein?

Enfim. Como eu disse, não vou sair por aí pregando a palavra de uma força maior pelo mundo (-q), nem começar a rezar fervorosamente ou algo do tipo. Tudo continua igual, mas fico feliz de ter finalmente chegado a uma conclusão. Se ela vai mudar ou não com o tempo, eu não sei, mas no momento eu concordo com o que Einstein (foi ele, não foi?) disse sobre a ciência nos aproximar de Deus. 
O espírito científico, fortemente armado com seu método, não existe sem a religiosidade cósmica. Ela se distingue da crença das multidões ingênuas que consideram Deus um Ser de quem esperam benignidade e do qual temem o castigo - uma espécie de sentimento exaltado da mesma natureza que os laços do filho com o pai, um ser com quem também estabelecem relações pessoais, por respeitosas que sejam. Mas o sábio, bem convencido, da lei de causalidade de qualquer acontecimento, decifra o futuro e o passado submetidos às mesmas regras de necessidade e determinismo. A moral não lhe suscita problemas com os deuses, mas simplesmente com os homens. Sua religiosidade consiste em espantar-se, em extasiar-se diante da harmonia das leis da natureza, revelando uma inteligência tão superior que todos os pensamentos humanos e todo seu engenho não podem desvendar, diante dela, a não ser seu nada irrisório. Este sentimento desenvolve a regra dominante de sua vida, de sua coragem, na medida em que supera a servidão dos desejos egoístas. Indubitavelmente, este sentimento se compara àquele que animou os espíritos criadores religiosos em todos os tempos. - Albert Einstein

P.S.: o que não significa que essa ~força~ não esteja também nos pequenos atos. Ela está tanto na existência do universo quanto na gentileza de uma pessoa. Está tanto numa célula-tronco quanto na bondade ou no respeito. Enfim.

2010-12-18

A paixão segundo Soledad


Queria conseguir pensar em outra coisa que não fossem os ombros de Dulce, os olhos de Dulce, a pele de Dulce. Não podia. Desejou que os vestiários da escola não existissem, ou que as garotas não tivessem o despudor estúpido de se despirem na frente umas das outras. Desejou que pudesse apagar da memória o momento em que Dulce se abaixava para enxugar os pés apoiados no banco, os seios pequenos de encontro às coxas, o cabelo preto que mesmo comprido não escondia nada. Não podia deixar de imaginar o quanto a pele morena dela deveria ser macia,ou o quanto conseguiria se perder na sua boca. Desejou ter os cabelos ainda mais curtos do que já estavam, os ombros mais largos, uns centímetros a mais de altura. Voltou a nadar apenas para poder olhar para Dulce na água e imaginar o toque da cintura marcada pelo maiô.

Soledad de los Reyes praticamente desconhecia a existência de Granermano, e o fato de que ele também tinha uma expressão no lugar do nome; isso, porém, era o menor dos seus problemas. Soledad nutria pelo seu nome uma espécie de respeito pelo fato de ele ser tão adequado à ela. 

Era adequado quando as outras garotas fechavam as portas do boxes quando percebiam as sua presença, mais por zombaria do que por realmente acreditarem que ela as olharia. Era adequado quando ria ante da ironia que era um dia - há muito tempo - terem lhe chamado de Sol. Era adequado quando lhe jogaram sutiãs na cara, e quando entreabria o próprio boxe para o despudor de Dulce.

(continua e tal)

2010-12-17

Pequenas grandes coisas

Tem um casal de garotos no IFCE que eu não sei exatamente de que curso são, mas de vez em quando os vejo pelos corredores. Fato é que desde a primeira vez que reparei que eles eram um casal eu morro de fofura e de admiração, porque não é fácil deixar tudo explícito assim dentro do IFCE. A graaaande maioria dos casais não-hetero do IFCE se concentram na Casa de Artes, que por sinal fica do lado de fora do instituto. Dentro as coisas são mais tensas. Não sei se é exatamente porque é um instituto tecnológico, porque a predominância é de homens ou porque centros de humanidades tendem mesmo a ser mais ~liberais~, mas o fato é que não é fácil ser gay/lésbica/bi/whatever lá dentro.

Enfim.

Tudo isso só pra chegar no fato de que ontem, por acaso, eu estava passando por um corredor e vi esse casal do qual falei no começo do post numa sala. Ainda nem sei de que curso eles são, mas estavam sentados lado a lado e falando e sorrindo e um com o braço passado no ombro do outro. Por um lado é meio triste pensar que até segurar na mão de uma pessoa é um ato de coragem, mas eu sempre fico feliz de vê-los juntos. Por ver qualquer casal não-hetero dentro ou fora do IFCE, diga-se de passagem. Queria que eles soubessem que dá sempre um calorzinho no peito por ver que não adianta, que não vão se deixar abalar ou deixar de viver por causa de nada nem de ninguém.

 ♥

2010-12-14

As pequenas coisas


Eu estou cansada e com sono e pensando que absurdo é que eu esteja reclamando disso quando tem tanta gente com problemas milhões de vezes piores do que um fim de semestre para aguentar. Eu estou pensando que existe toda uma manha em ser drama queen, em encontrar pedaços de nostalgia em momentos felizes, em às vezes ter o prazer mórbido de lembrar de coisas ruins só pra ter certeza de que o que é bom deve ser aproveitado. Hoje eu peguei o ônibus na hora certa, e de manhã estava chovendo e isso é bom. Não gosto de sair com guarda-chuva, é tão raro precisar usar e, se precisar, não acho ruim me molhar um pouco. Isso é tão raro, sair assim, com o dia mal amanhecido por causa das nuvens pesadas, quando na semana passada estávamos todos morrendo de calor debaixo de um sol escaldante. Sair assim, com aquele cheiro de asfalto molhado que não é tão romântico quanto terra molhada, mas tem lá seu charme. E o cheiro da chuva quando entra em casa tem algo a mais que não sei identificar exatamente, sei apenas dizer que é algum cheiro da infância, dos tempos em que todos os dias que eu me lembre foram assim, nublados, mal amanhecidos, molhados e extremamente bonitos. É claro que não foram todos assim, mas são os que eu me lembro. É tão humano isso de só lembrar do que é bonito, de apagar automaticamente o que não foi bom, pra depois ficar rememorando em doses homeopáticas como que conferindo se as lembranças ruins ainda estão lá. É tão humano isso de dizer a si mesmo que está tudo bem, de pensar que o ano passou depressa, de pensar que tudo o que a gente precisa é de umas boas férias. É tão humano isso de abrir cadernos, word, blogs há uma hora da manhã pra dizer um monte de coisas sem sentido. E isso de alguma forma me faz pensar que talvez o cheiro da chuva e o cheiro do mar tenham em comum um certo sentimento de desolação maior que tudo, tão maior que vira essa nostalgia que a gente nunca sabe se é triste ou feliz. Vai entender.

2010-12-13

A paixão segundo G.H.

Granermano Cortez tinha dezessete anos e a certeza de que seu nome era uma piada de mau gosto. Era até complicado colocá-lo junto da palavra "grande" em uma mesma frase. Ele já havia se perguntado por que diabos resolveram lhe chamar assim, mas sua mãe apenas dizia que ele não deveria ser ingrato e achar ruim um nome que inspirava amor. Granermano, no entanto, achava que a única explicação plausível seria a de que os seus pais perderam uma aposta na faculdade ou algo assim, e então arranjaram a desculpa do amor.

Na verdade, até onde sabia, seu nome nunca tinha inspirado amor em ninguém. Se chamar Granermano nunca havia feito com que alguém automaticamente pensasse que ele deveria ser um grande cara legal ou algo assim. Já haviam lhe dado todo tipo de apelidos possíveis, dentre os quais os mais aceitáveis eram Gran, Hermano, Pequeño e ainda Big Brother para os mais engraçadinhos. Os amigos costumavam chamá-lo de Gran Hermano, devidamente - e enfaticamente - separado, mas depois essa variação acabou diminuindo para G.H. e assim ficou. Granermano até gostaria de se chamar Gêagá, se a grafia não fosse ainda mais absurda que a do seu nome original. 

Granermano Cortez, no entanto, estava agora ocupado demais para pensar nas variações do seu nome. Sempre passava alguns momentos do dia ocupado olhando - ou procurando olhar - para Soledad. Ela, tão pequena que o mundo poderia perdê-la em suas voltas, era quem morava nos sonhos de G.H. Ela, em quem os traços finos contradiziam os cabelos mais curtos ainda que os dele e as camisas de flanela, em quem o nome era uma sentença inversamente proporcional à dele. Ela, que o desconcertava com uma languidez masculina que ele não saberia dizer se era, na verdade, uma masculinidade lânguida, ou se nenhuma das expressões fazia sentido.

(continua e tal)

2010-12-09

As coisas que eu não disse para as pessoas que não existem fora de mim

Ah, Will, que saudade de você!

Você que sofre por amor sem precisar nomeá-lo, você que deixa o whatever mode sempre ligado, que vê as pessoas terem pena do seu sorriso cansado e dos seus olhos tristes, você que sabe que a culpa não é deles e está cansado de si mesmo, você que aprendeu cedo demais que o conformismo tem um gosto amargo, que olha enviesado pra câmera do vídeo caseiro

Onde você quer estar daqui a dez anos?

e responde

Eu não sei.

e você sorri porque isso não é triste, é apenas verdade; você realmente não sabe, e não é desinteresse, não é inércia, é pura e simplesmente não saber.

Ah, Will.

Você que é homem por não saber ser mulher, que também tem os olhos cansados e o sorriso triste e me faz escrever com grafite e papel. Você pra quem não disseram como o mundo funciona e descobriu sozinho, que nunca precisou que te dissessem que está fazendo tudo errado, porque você sabe, Will, você sempre sabe, e você continua porque é assim que as coisas são.

Tento não imaginar o que aconteceria se você encontrasse o Jack.

Jack, meu bom Jack, meu poço de narcisismo disfarçado de auto-piedade.

Você que carrega o coração nas mãos e só sabe falar de amor, ainda que o romantismo tenha se perdido em algum lugar da eterna adolescência do Will, disfarçado de inocência e lascívia. Você e os trinta anos que eu não tenho, você e a amargura sem sorrisos cansados. Você que queria ter feito tudo errado só pra ver se seria diferente, Não analisa, não!, já dizia Eduardo e Will o ouviu, mas é tarde demais, você já analisou. 

Ah, Jack.

Você que me acorda de madrugada pra lhe dar mais uma vida miserável, você que ainda não aprendeu a arte de não se importar, você que ainda não descobriu o que é não procurar pelo lado ruim. Você que continua porque não tem coragem de parar, você que olha pro papel e diz

Eu não sei o que fazer.

mas você sabe, você sempre sabe. Você só não pode, porque dói demais, porque não cabe no seu peito, porque seu coração já está partido há tanto tempo que você já não se lembra de como era antes de ele saltar para as suas mãos.

Tento não imaginar como seria se você encontrasse o Will, mas é tarde demais.

Eu já nasci.

2010-12-03

You thought the stars were sending you love

#12 — The person you hate most/caused you a lot of pain

There was a time you seemed to be fine
You were a rock when you were a child 
Waiting for the turn of the tide

Pessoa 1,


Eu não lembro e ninguém sabe ao certo, então aparentemente estamos quites. Talvez eu realmente pudesse acreditar que não aconteceu. Who knows.

When you came home, you started to cry
When you woke up, you wanted to die

Pessoa 2,

Você nunca vai entender o mal que me fez - e continua fazendo - então eu já desisti de tentar fazê-lo parar. sei que existe uma grande probabilidade de que eu me arrependa disso no fim das contas. Você me fez deixar de acreditar em muitas coisas, acreditar em outras que certamente não me ajudarão a ser melhor, passar horas chorando por simplesmente não conseguir mais me lembrar de um tempo que não tenha sido assim, entre outras coisas. Mas, se eu for mesmo tão ruim como vocês gostam de dizer, você tem uma boa parcela de culpa. Não é ódio, é um conformismo amargo.

I thought I could be able to find
Something to save all I left behind

Pessoa 3,

Eu não queria ter te colocado nessa lista/carta. Mas, de qualquer forma, obrigada. Às vezes a gente precisa se foder mesmo pra entender algumas coisas.